![]() Monday, August 20, 2007 'Um dia a maioria de nós irá se separar. Sentiremos saudades de todas as conversas jogadas fora, as descobertas que fizemos, dos sonhos que tivemos, dos tantos risos e momentos que compartilhamos... Saudades até dos momentos de lágrima, da angústia, das vésperas de finais de semana, de finais de ano, enfim, do companheirismo vivido' - Cara… Tem um flamingo no canto da sua sala! - Não é um flamingo, seu idiota – falei rindo – É só um abajur comprido! - Acho que o Stanley devia parar de fumar, não está fazendo bem a ele – Karina falou arrancando risos da gente - Que engraçada que você é – Stanley provocou – Porque não pega isso que você está queimando e enfia- - OI! – Peter atirou uma almofada nele ao mesmo tempo em que atirei um pé do meu sapato – Olha a educação, você não está naquele pardieiro que chama de casa - Não fala da minha casa, seu otário – ele rebateu, devolvendo meu sapato atirando-o com força para cima de mim – Ao menos minha mãe sempre sabe por onde meu pai anda. Já a sua não pode se dar ao luxo de dizer o mesmo... – Peter fez um gesto obsceno para ele e Stan riu debochado - Quanta delicadeza desses meninos... – olhei para Karina e ela revirou os olhos - MAS QUE BAGUNÇA É ESSA?? Wayne apareceu na sala com um aspirador de pó na mão, parecendo muito irritado. Ele usava terno e gravata e seu cabelo estava anormalmente penteado. Olhava da gente e para os cinzeiros em cima da mesa de centro e parecia a ponto de entrar em colapso. Stanley me olhou assustado. Ele sempre teve medo do meu irmão. - FORA! – Wayne berrou com o aspirador na mão – FORA DA MINHA CASA, TODOS! Em menos de cinco segundos só havia restado eu e Wayne na sala, e o rastro que Peter, Stanley e Karina haviam deixado para trás. Olhei enfurecido para ele por ter expulsado meus amigos e puxei a bacia de pipoca para o meu colo, botando os pés em cima da mesa, como se o desafiasse a me provocar. - O que está fazendo sentado ai ainda? Ajude-me a limpar essa bagunça, ele já vai chegar! Sabe que mamãe proibiu magia dentro de casa, tenho que arrumar a sala à maneira trouxa! - Claro que eu ajudo... – peguei o copo de suco da mesa – Depois que acabar de comer Sorri debochado para Wayne e enchi a mão de pipoca, enfiando tudo na boca. Ele caminhou até o sofá e antes que eu pudesse reagir, sugou todo o conteúdo da bacia e do copo com o aspirador, fazendo tudo evaporar. - Pronto, acabou. Pode me ajudar agora? – fiquei olhando a bacia e o copo vazio e Wayne me deu um tapa – Levante logo dai! - Posso saber o motivo do chilique? – disse alisando a cabeça – Está parecendo uma dona de casa! - O diretor da Academia de Aurores está vindo para me entrevistar, imbecil – Wayne ajeitou as almofadas do sofá. Tive uma súbita visão da vovó fazendo isso na casa dela – Eles não podem entrar aqui e sentir esse cheiro que vocês deixaram! - Ao menos saberia quem você é de verdade, e não esse Wayne psicótico – disse rindo – Estava tudo no nosso quarto mesmo... - Estava mexendo nas minhas coisas? – ele apertou minha orelha e o empurrei - O quarto também é meu, posso mexer onde quiser - A gaveta onde guardo as MINHAS roupas não é nossa, é só minha – ele aspirou tudo que estava em cima da mesa e me encarou furioso – Torne a abri-la e acabo com você - Tanto faz... – disse sentando no sofá outra vez – Por que ele vem até aqui, afinal? Não sabia que faziam entrevista em casa - Eu me inscrevi para estudar em Londres, eles querem saber por que não dei preferência à da Suécia. E você há de convir que meu histórico não é nada que se espera de um candidato a auror – ele pegou uma almofada no sofá e começou a me espancar com ela – E sai desse sofá, está amassando as almofadas! Faz um favor pra humanidade e desaparece por algumas horas também, que tal? - E se eu quiser assistir sua entrevista? – provoquei - SOME DAQUI! Wayne atirou uma almofada para cima de mim e sai da sala rindo. Desde que ele recebera os resultados dos N.I.E.M.s com notas surpreendentemente boas, estava diferente. Não na maneira idiota de agir comigo, mas levava mais a sério o fato de que agora ele seria um aluno da Academia de Aurores e não era mais um moleque, que precisava crescer. Era engraçado ver isso. A campainha tocou e ouvi uma voz diferente sendo recepcionada pelo meu irmão. O diretor havia chegado. Queria ficar escondido na sala para ver a entrevista, mas sabia que se Wayne me visse na sala, teria que passar o resto das férias dormindo no quarto que foi de Karen. Então não vi alternativa senão ir para o jardim. Não tinha ninguém em casa além de Wayne, eu e os empregados. Mamãe e Megan haviam saído para fazer compras de presentes para meu pai, pois hoje era aniversário dele, Karen não morava mais conosco e estava em sua casa e papai estava no Ministério. Odiava a casa tão vazia, sentia falta de Karen por perto para conversar. Fiquei deitado com as costas na grama durante todo o tempo em que meu irmão ficou preso na entrevista, olhando para o nada. Devia estar cochilando quando ele jogou uma flor dentro da minha boca e levantei engasgado. - Como foi a entrevista? – perguntei cuspindo a margarida na grama - Boa – disse sentando ao meu lado – Consegui a vaga - Wayne, isso é ótimo! – falei animado – Porque está com essa cara de bunda? - Não é cara de bunda, esse é um momento solene... – ele se esticou e me olhou com uma cara pomposa – É o momento onde percebo que estou, enfim, livre de você. Não vou mais ouvir roncos seus à noite... - É... – fiz a mesma cara idiota que ele – É um momento histórico pra mim também. Saber que vou acordar todos os dias nas férias e não dar de cara com você babando na cama ao lado... - Pede perdão! Havia esquecido por completo dessa brincadeira idiota que costumávamos fazer um com o outro quando nos ofendíamos e não deu tempo de me defender. Wayne já estava em cima de mim e apertava minha cara com a mão, deixando apenas minha boca livre para respirar. Dava socos no braço dele tentando me soltar, mas em vão. Wayne era muito mais forte. Ele me prendia sem dar brecha para me soltar e me batia nele com mais raiva, quando vimos uma sombra nos cobrir. - Ah pelo amor de Deus, parem com isso, os dois! – mamãe estava de volta e nos olhava impaciente – Wayne, seu pai está lhe chamando na sala! Wayne me soltou e entrou apressado. Levantei depressa do chão para segui-lo. Se papai estava lhe chamando, certamente seria para dar uma bronca. E depois de apanhar dele, não seria nada ruim assistir a mais esse espetáculo. Mas quando entrei na sala e vi a cara que papai sabia, entendi que a bronca dessa vez viria para a pessoa errada. E não me enganei. - Wayne, pode me explicar que cheiro é esse? – papai falou controlando o tom de voz - Ah papai, o senhor sabe... – meu irmão respondeu despreocupado. Ele ia me dedurar e rir - Sim, eu sei! – ele agora não se controlava mais – O que quero saber é porque minha sala está assim! - Pai, eu- - ia assumir a culpa antes de ser delatado, mas Wayne me interrompeu - Desculpa pai, não vai se repetir – falou abaixando a cabeça - É bom que não. E por que vocês estão sujos de terra? Vão se lavar, não vão sentar à mesa nesse estado Wayne assentiu com a cabeça e subiu as escadas mudo. Corri atrás dele e quando já estávamos no quarto o segurei. - Por que assumiu a culpa? Não foi você - Digamos que livrei sua cara pela última vez – disse segurando meu ombro e fazendo a mesma cara solene e idiota de antes – A partir de Setembro não vou mais estar por perto para cuidar de você. Mas mesmo quando eu não estiver por perto, estarei por perto. Quero dizer, se divirta, se meta em encrenca, seja feliz, e quando pensar em mim, não quero que me veja como um lúgubre. Wayne me soltou e entrou no banheiro, fechando a porta. Fiquei parado olhando pra porta sem entender bem o que ele quis dizer, mas não ri. Naquela tarde pensei em tudo o que eu e ele tínhamos passado juntos. Pensei em como brincávamos em Harper Woods, como ele sempre me deixava lá sozinho no escuro, todas as brigas e encobertas, e em todas as noites que dividimos o mesmo quarto. Ia sentir muitas saudades disso, e acho que não seria o único. Depois de me limpar e me arrumar para o jantar, fui até o escritório do papai e contei a verdade. Fiquei de castigo pelo resto das férias, mas não me arrependi. Wayne finalmente contou a ele que havia sido aceito na Academia de Aurores e papai admitiu que não poderia ter recebido um presente de aniversário melhor que aquele. Karen também apareceu para o jantar e trouxe um álbum de fotos que havia se misturado por engano nas coisas dela quando se mudou. Passamos o resto da noite revendo fotografias antigas e rindo, relembrando as histórias que cada uma delas carregava. Olhei para meus irmãos sentados no chão passando as fotos de mão em mão, e depois meus pais dividindo uma poltrona, contando as histórias que não lembrávamos mais por serem de quando éramos muito pequenos. Aquela noite foi a última vez que vi minha família completa, reunida dentro da casa onde cresci. |