Monday, September 10, 2007


A primeira semana de aula tinha sido extremamente cansativa. Ainda estávamos todos absurdamente assustados com os horários sobrecarregados e as pilhas de deveres acumuladas, mas nada havia sido mais exaustivo do que as novas aulas de ‘Defesa Avançada’, lideradas por Kegan O’Shea.
Depois de uma atmosfera incrivelmente ansiosa por parte de todos nós para descobrirmos do que se tratava a aula, Kegan surpreendeu a todos explicando os objetivos dos encontros. A sala inteira prendia a respiração a cada palavra.

- Esses encontros são como um preparatório avançado de Defesa Contra as Artes das Trevas. Vamos estudar azarações e contra-azarações avançadas demais para serem dadas em sala de aula, mas que vocês precisam aprender. Acho que todos sabem os rumores ruins que andam espalhando, não é? Estar preparado para enfrentar o perigo fora de Hogwarts. Esse é o principal objetivo. Essas aulas servirão principalmente para quem pretende se tornar auror ou lutar contra as trevas em algum grupo. Mas já adianto: nossos encontros serão bem cansativos e exigirão preparo, tanto físico quanto emocional, concentração, equilíbrio, disciplina e paciência. Portanto, quem acha que não consegue se encaixar em todos esses quesitos, melhor nem começar...

Lancei um olhar assustado para Scott, que retribuiu. O Kegan brincalhão, pelo jeito, ficaria do lado de fora daquela sala. Ali dentro ele seria bem exigente. Mas ninguém se atreveu a levantar e abandonar as aulas.

Após três horas, descobrimos o porquê de tantos quesitos. Repassamos vários feitiços simples e vários complicados. Kegan circulava pela sala durante os duelos e gritava para que fôssemos mais rápidos e certeiros, e quando o sinal tocou, todos só desejavam um pouco de calma e tranqüilidade. Quando o final de semana chegou, aproveitamos o tempo livre para adiantar deveres e conversarmos sobre a semana. No fim da tarde de domingo, estávamos todos nós ali deitados na grama dos jardins, sem fazer absolutamente nada.

LS: Um terror. Meu horário está um terror. Eu amo a professora Sprout, amo mesmo. Mas quem consegue suportar seis horas de aula com ela por semana? Por mais que ela seja uma graça, isso é sobrenatural! Acho que vou mudar de profissão. – Louise fechou os olhos com as mãos na testa, parecendo exausta.
SW: Isso. Ótima idéia, Lou. O que acha de montarmos uma banda? – Sam perguntou e rimos.
MF: Bom, não posso reclamar. Meu horário está até acessível, e eu estou no time de Hogwarts! TIME DE HOGWARTS! – Mark enfatizou empolgado e instantaneamente eu, Alex e Louise levantamos os braços animadas.
AM: Mal posso esperar pelos jogos, viagens...
SF: Vocês estão se sentindo “OS intocáveis”, não estão? – Scott perguntou debochado. – Façam bonito, por favor.
LS: Não vamos perder a taça para um bando de estrangeiros sem noção, Scott. Essa taça já é nossa.
SW: Ah, que inveja, que inveja!

E os assuntos foram surgiram. Pouco a pouco, outros amigos começaram a se juntar, inclusive Monn, com muitas olheiras e livros nas mãos. Mesmo com tantas coisas diferentes para ocuparem meus pensamentos, um fato das minhas férias de verão continuava a ser repassado na minha cabeça sem parar...

°°°
Nova Deli, Índia. Início de agosto.

As férias que haviam começado monótonas, se tornaram animadas desde que eu, Tia Yhara e Yoshi embarcamos para a Índia. Como papai, mamãe e Yuri (que finalmente terminara seu estágio e agora era medibruxo de fato), estavam demasiado ocupados com seus trabalhos, tia Yhara não se demorou em procurar pacotes e passeios interessantes. E a Índia, em poucos dias, se tornara o pais mais interessante que tinha visitado até então.

Os nativos não eram muito receptivos, mas o grupo de turistas que estavam conosco era deveras animado para se importar com hospitalidade. E justamente com eles, conhecemos se não todos, a maioria dos pontos turísticos e lugares bonitos do país.
Yoshi, que anteriormente vinha me tratando de maneira extremamente formal, agora parecia fazer um esforço enorme para esquecer tudo que tinha acontecido, e diversas vezes nos surpreendíamos rindo ou conversando naturalmente.

Faltavam apenas dois dias para voltarmos para o Japão quando o guia turístico nos levou até uma feira municipal. Logo nos animamos e começamos a escolher presentes para toda a família. Caminhávamos entre as tendas carregadas com os mais diversos e estranhos tipos de coisas: artesanatos, vasos de gesso e barro, véus bordados a mão, instrumentos talhados de madeira, roupas coloridas e diferentes... E mesmo com toda essa diversidade, a atração que mais chamou a atenção de todo o nosso grupo não era colorida, grandiosa e nem rara. Tratava-se de um encantador de cobras, que se encontrava sentado no chão, no meio da praça, com as pernas cruzadas, sem camisa, um turbante na cabeça, e tocava levemente uma flauta. Em sua frente, havia um vaso de barro, de onde vagarosamente, começava a surgir a cabeça de uma cobra tão imensa que garanti dar dois passos para trás.

A medida que ele ia tocando a flauta, a cobra ia descrevendo movimentos suaves com o corpo e a cabeça, e abandonando o vaso. O guia e alguns turistas pareciam encantados com o som, pois se aproximaram. Outros preferiram manter a distância. Yoshi, Tia Yhara e eu observávamos de longe e atônitos o show. O flautista mantinha contato visual com a cobra enquanto soprava, e ela abriu ligeiramente a boca revelando grandes presas. Quando seu corpo inteiro conseguiu se livrar do vaso e se estendeu no tapete em frente, ela manteve parte levantada, e agora encarava todos os expectadores a volta, a imensa boca ainda aberta.

Estava tudo indo bem. A cobra parecia completamente disciplinada e seguia o som do flauta, não demonstrando ameaças. Mas quando o flautista parou de tocar, e uma menina que passava por ali deu um grito de terror, a cobra se perturbou. Começou a sacudir a calda e fazer silvos de irritação. O homem tentou agarrar o seu pescoço, mas ela investiu contra ele que recuou imediatamente assustado. Mandou todos a volta permanecer parados e quietos, mas foi como se tivesse dito para todos correrem o mais rápido que pudessem, pois em um minuto, a praça se tornou um verdadeiro caos.

E bem no centro do caos, estávamos nós três, estáticos. Tia Yhara apertando nossos braços com força. Não conseguimos nos mover. Enquanto a praça se esvaziava, a cobra se virou para nós. Veio em nossa direção, devagar, e parou bem na minha frente. Levantou metade do corpo e abriu a boca novamente. Senti o coração parar. Percebi que era uma questão de tempo até ela me picar ou me atacar de qualquer outra maneira. Esperava aquilo a qualquer momento... Mas o que eu menos poderia esperar aconteceu.

Um silvo rouco, silvos desconhecidos. Como uma língua diferente. Yoshi se lançara na minha frente, os braços abertos, e estava conversando com a cobra por meio de silvos. O animal continuou como estava por um minuto, mas então, foi gradativamente recolhendo o corpo, fechando a boca, até se esticar inteira no chão. O restante das pessoas que tinham permanecido na praça, parou para observar a cobra seguir os comandos de Yoshi e sozinha, voltar para o vaso. Por um minuto, ninguém falou nada. Yoshi foi até o vaso e lacrou-o com a tampa. O flautista, com a boca aberta, assustado, não conseguiu dizer nada, então apenas estendeu a flauta para Yoshi, dando-a de presente. Yoshi a pegou e sorriu de leve. Ignorando todas as pessoas que o encaravam, inclusive eu e Tia Yhara, mudas, ele saiu andando sozinho pela avenida.
Naquele momento, minha cabeça deu uma volta completa e meu estômago enjoou. Yoshi é ofidioglota e eu tive a impressão de que nunca saberia disso, se dependesse dele.

°°°

MF: Yulli? Alô? – alguém estalou o dedo na minha cara e eu sacudi a cabeça voltando ao normal.
YH: Oi Mark.
MF: Você ta legal?
YH: Estou sim. Só estava um pouco distraída.

Ele franziu as sobrancelhas por um minuto e depois sacudiu os ombros rindo. Meus amigos continuavam deitados no gramado conversando e olhando as primeiras estrelas que surgiam no céu. Desde aquele dia, ainda não conversara com Yoshi. E nem contara a ninguém o que tinha acontecido. Mark se deitara ao meu lado e eu nem tinha percebido.

MF: Sabe, eu andei pensando... – ele olhou ao redor se certificando que todos os outros estavam distraídos com outros assuntos e falando baixo de modo que só eu escutasse. – Eu quero conversar com você, tudo bem? Não agora. Você tem algum tempo livre amanhã?
YH: Tenho. Dois, depois das aulas de poções.
MF: Ótimo. Também estou livre. Então, se estiver tudo bem pra você, amanhã a gente conversa.
YH: Ok. Aconteceu alguma coisa?
MF: Ainda não. Mas pode acontecer... – ele disse misterioso e riu. Ri também. Estava parecendo uma aula da Endora. – Não seja curiosa. Amanhã.
YH: Ok, ok. Amanhã então.

Sorrimos e voltamos aos assuntos dos outros. O quer que fosse, eu já imaginava aonde a nossa conversa iria acabar.