Friday, August 22, 2008


Do diário de Alexandra McGregor

- Nesta foto, Alex, você estava aprendendo a girar um bambolê...
- Não, vovô, eu achava que era uma roda de carro, até fazia os barulhos...Estava atropelando a minha boneca, já tinha conseguido arrancar o braço dela. - respondi.
- É, você tinha uns 3 anos, e sempre gostou de brincadeiras mais agitadas do que tomar chá com as amigas. - disse meu avô enquanto estávamos sentados no chão da sala vendo fotografias antigas. Era meu último recesso de Páscoa, antes de me formar e tudo parecia diferente.
- Que lindinha, você estava sem os dentinhos da frente...
- Onde isso? Lembro-me dessa, ganhei um galeão da fada do dente. Fiquei rica.
- É e depois disso, a “fada” teve que dar galeões para todos os seus primos quando perdiam um dente. Quase fui à falência.
- Ah, vovô, e eu achando que a fada do dente nos visitava de verdade, agora acabou o mistério. - rimos.
- Há muito tempo não via estas fotos...
Olhei para a foto que vovô segurava e fiquei emocionada: era uma foto da minha mãe comigo. Eu não devia ter mais de um ano de idade.
- Mamãe e...- Ao lado dela havia dois homens: Connor, loiro, e com um jeito cativante de sorrir, o homem que eu sempre achei que fosse meu pai, e seu irmão Kyle, moreno de olhos cinzentos e um pouco frios, que descobri depois ser meu pai verdadeiro.
Ele após olhar as fotos comentou saudoso:
- Sabe você tem muito deles. Os cabelos de sua mãe, mas o jeito de rir debochado é do seu pai...
- A qual dos dois homens você se refere vovô, ambos são seus filhos. - disse tentando disfarçar a mágoa e virava a foto aonde as imagens iam de um lado a outro.
- Connor tinha olhos cinzentos e cabelos castanhos, mas Sarah, tinha os cabelos negros, e lindos olhos azuis. Pareciam dois lagos calmos, mas quando ela se irritava, via-se isso nos olhos, ficavam escuros. Nem mesmo Virna, ousava provocá-la nestas horas. Você tem o gênio dela.
- Mas e os meus olhos verdes? O pai do Dylan, tinha olhos iguais aos seus. Ou será que há mais alguma coisa que eu não sei...- insisti e ele me olhou um pouco constrangido, mas disse firme:
- Sei o que está passando por esta sua cabecinha, porém tenha certeza que você é minha neta, nunca duvide disso. Minha mãe era uma O´Dell, de Donegal, e você tem os olhos dela. Considere isso um presente, pois ela era uma mulher especial, uma ótima mãe. De todos os descendentes dela, somente meu sobrinho Bryce, tinha olhos verdes e agora você. Veja, aqui tem uma foto dele...- e me mostrou uma foto onde aparecia um jovem bonito, com jeito indolente, de cabelos claros e olhos que pareciam verdes. Sabe aqueles garotos que a gente olha e pensa: ‘ele é encrenca’, mas não consegue se afastar? Esta era a expressão que via naquele rosto sorridente. Sorri de volta:
- Nossa, ele era bonito. Devia arrasar corações...
- Ah, Bryce era um ótimo garoto, inteligente... Era auror...
- Auror? Porque não fico chocada?- e vovô riu e continuou:
- Era um jovem idealista, e quando se formou na Academia, queria fazer a diferença. Desapareceu em ação, durante a segunda guerra, queria ajudar a proteger aos trouxas. Meu irmão Clive e sua esposa Marion, nunca superaram isso, e perderam o gosto pela vida, morreram alguns anos depois. Ele era filho único.
- Mas você e vovó perderam os dois filhos no mesmo dia... Como suportaram?
- Mas tínhamos você e os meninos, que mesmo com a mãe presente precisavam de nós. Não podíamos nos dar ao luxo de desistir. - E puxou mais fotos e riu com uma em particular, mostrava um dia das bruxas muito animado:
- Nesta você está fantasiada de princesa do mar, você enlouqueceu sua avó, e ela fez a roupa do jeito que você queria, afinal você não queria ser uma sereia. 'Isso seria muito comum', nas suas palavras. - rimos e eu olhei para a foto, que mesmo em preto e branco dava para ver as várias conchinhas e estrelas do mar, penduradas na saia do vestido e enfeitando a coroa. Eu devia ter uns 3 anos naquela foto, e vovô continuou falando:
-... E Kyle estava de pirata, Dylan vestiu-se de médico trouxa. Ele sempre quis ser curandeiro. Lembra quando você era pequena, devia ter uns 8 anos, e cortou o pé, num caco de vidro?
- Aai se lembro, aquilo doeu muito. Acho que foi a primeira vez que desmaiei na vida. Só me lembro de acordar aqui em casa...Dylan foi um herói, me trazendo para casa.
- Dylan? Não foi ele que cuidou de você. Foi o Kyle que a encontrou e a trouxe você nos braços. Ele devia ter pouco mais de 12 anos. Foi à primeira vez que vi, aquele garoto assustado com alguma coisa. Ele sempre a olhou diferente, mesmo quando pequeno, eu devia ter cuidado melhor de vocês dois.
- Não gostaria de falar disso vovô...
- E eu respeitei seu desejo até agora, mas depois do enfarto resolvi que não vou guardar nada que me preocupa e vocês me preocupam. Quero que de alguma forma, voltem às boas...
Olhei para ele e ele me pediu que esperasse:
- Sei que devia ter contado sobre os seus pais. Mas eu sempre admirei o jeito que os meninos cuidavam de você e achei que era um amor de irmãos. Na verdade, eu quis achar isso, pois seria mais fácil para mim entende? Não teria que me confrontar com a realidade. Peço que me perdoe.
- Não há o que perdoar, vovô. Se alguém errou, fomos eu e Kyle. As pessoas sempre falaram que primo e prima era uma coisa bizarra, devíamos ter ouvido. Ok, eu sei que na nossa família há vários casamentos entre primos, mas não tão próximos quanto eu e ele. Mas isso agora é passado, cada um de nós seguiu em frente e eu estou apaixonada pelo Logan, planejo um futuro com ele, vou ter uma carreira de auror, como várias gerações de McGregors...
-Gosto do Logan, ele é forte, íntegro e vem de boa família. Vocês me darão bisnetos fortes e saudáveis. Mas isso não é o bastante. Quero que você e Kyle voltem a ser amigos, sei que não vai ser igual a quando eram pequenos, mas não quero morrer com vocês afastados deste jeito, precisam um do outro, são família, e vão trabalhar na mesma área.
- Kyle não precisa de ninguém vovô. Ele sempre deixou isso claro, e você não vai morrer...
- Prometa Alexandra... - e ele segurava meu rosto para que eu não desviasse os olhos:
- Está bem, não sei quanto tempo vai demorar, para que eu e Kyle voltemos ao que era antes, mas está bem: Prometo! Quando você ficou tão intransigente assim? - e ele me soltou aliviado.
- Aprendi uma ou duas coisas naquele hospital...- ele respondeu piscando
- Vamos voltar às fotos? Podemos aproveitar e montar alguns álbuns...Tem fotos de várias pessoas que não conheço por aqui. E é impressão minha ou vovó está de pernas de fora nesta foto?- disse mostrando uma foto onde uma mocinha usava um maiô, dos anos 20.
Não demorou muito e minha avó se juntou a nós e adorou a nossa idéia de organizar as lembranças e fotos. Ela contava as historias das pessoas da família que eu não conheci e ia identificando quem era parente de quem. Notei que depois da minha promessa, meu avô pareceu aproveitar mais nosso tempo juntos e não se constrangia mais em falar do Kyle na minha frente. Um dia tudo voltaria ao normal, bastava ter paciência.