Monday, September 01, 2008


Hogwarts, 22 de abril de 1979.

- Ah, Yoshi, finalmente você chegou, meu rapaz! Tenho que te apresentar ao meu amigo, Leoncius McLaggen, dono do maior laboratório de poções da Grã-Bretanha! – Slughorn abriu caminho entre os convidados, super afoito e satisfeito ao ver que eu e Yoshi entrávamos na festa. Seu bigode prateado estava levantado por causa de um sorriso protuberante que ele trazia no rosto e usava um conjunto de terno de veludo roxo púrpura, com um colete apertado no barrigão, da mesma cor. Yoshi só teve tempo de sacudir os ombros, pois Slug já havia agarrado seu braço e o arrastava entre as pessoas. Sorri, avisando que ia pegar bebidas com a mão, e tomei a direção oposta.

A festa do “Club do Slug” estava se saindo muito melhor do que eu poderia ter imaginado. Por ter sido apenas um dia antes da Páscoa, poucos alunos haviam ficado em Hogwarts, e desses, pouquíssimos faziam parte do clube ou haviam sido convidados de outra forma (como eu, que estava de acompanhante). O salão, no entanto, estava lotado dos mais diversos tipos de bruxos que já havia visto. Muitos aparentavam ter a mesma faixa etária que Slughorn e enquanto ia traçando o caminho até a mesa de bebidas, ouvi vários deles conversando sobre “assuntos importantes” tais como política, Gringotes, criaturas mágicas e etc.

Mal tinha acabado de me servir de ponche e uma voz grave e conhecida disse meu nome, às minhas costas. Virei e tive que segurar firme a taça para não deixar que se espatifasse no chão, tamanha surpresa. Era Sergei.

- Oi. – ele disse abrindo um sorriso largo e também segurando um copo com whisky de fogo.
- Oi. – respondi sentindo o rosto arder. Abaixei os olhos e comecei a girar o morango que boiava no meu ponche.
- Não sabia que você era do clube. Nunca te encontrei nas festas... – ele disse e andou alguns passos de modo que ficasse bem ao meu lado.
- Na verdade, não sou do clube. Estou aqui de acompanhante. – respondi o encarando e ele pareceu se interessar.
- Ah, sei. Namorado? – perguntou forçando um tom natural, mas não conseguindo disfarçar a curiosidade. Ri.
- Não. Meio-irmão e afilhado. – respondi me sentindo mais à vontade e sorrindo.
- Como?
- Longa história. – comecei, mas ele fez uma cara do tipo “e daí? Não tenho pressa” que me convenceu a explicá-lo – Resumindo: minha madrinha adotou um bruxo, o Yoshi. Ele é da sonserina e está se formando também. Quer ser preparador de poções. Como o Slug convidou todos os seus amigos preparadores para virem aqui hoje, seria uma ótima oportunidade para o Yoshi conhecê-los. De fato, está sendo, pois Slug já foi o apresentar para alguns deles e eu acabei ficando sozinha...
- Bom, não está mais. – ele sorriu e nos sentamos em um confortável pufe no canto.
- Também não sabia que você era do Clube. – puxei assunto enquanto observava um grupo de senhoras que aparentemente estavam comparando suas varinhas.
- Você ainda não sabe muitas coisas sobre mim. – ele respondeu com um tom descontraído e misterioso. Ri. – Também estou de acompanhante. Do Kyle. – apontou para o irmão da Alex, que conversava com um homem de semblante sério. - Sempre o acompanho nessas festas do Slughorn. Comida boa, bebida boa, companhias ainda melhores... - deixou a frase ir morrendo propositalmente. Sorri, constrangida.
- É, nada mal. – respondi e ficamos alguns minutos em silêncio. Yoshi passou por nós conversando com um bruxo tão barrigudo quanto Slughorn e sacudiu os ombros, parecendo entediado. Quando ele sumiu de vista novamente, percebi que Sergei olhava para o outro canto do salão e o acompanhei.
- Aqueles são Alex e Logan? – perguntei assustada. Alex e Logan pareciam ter chegado há pouco na festa e estavam parados, conversando com Kyle. – Ah não...

Completei quando Kyle puxou a varinha para Logan, que fez o mesmo, obrigando Alex com uma careta horrível a pular entre os dois e evitar que começassem um duelo. Sergei se levantou de imediato ao meu lado, abrindo caminho entre as pessoas até a confusão. Fui atrás.

- Você não vai querer medir forças comigo, seu moleque! – Kyle dizia provocando e Logan fechou ainda mais a mão em torno da varinha.
- Vamos ver quem é o moleque então. Porque está com tanto medo de brigar? – Logan respondeu no mesmo tom. Kyle se adiantou, mas Sergei o empurrou pra trás com violência.
- PAREM. VOCÊS DOIS! – Alex gritou nervosa chamando a atenção da maior parte dos convidados ali ao redor. – Chega. Vou sair daqui! – disse com a voz trêmula se afastando. Logan correu atrás dela e Kyle saiu pisando firme para o outro lado. Sergei olhou significativamente para mim e o seguiu. Fiquei parada no meio da roda que já haviam aberto para o possível duelo e todos me olhavam. Yoshi saiu me puxando para fora também.
- Você está bem? – perguntou quando já estávamos no corredor. Balancei a cabeça, positivamente. – Vou te acompanhar até a Lufa-lufa.
- Não precisa. Fique aqui. É importante pra você, Yoshi. – disse com firmeza e ele vacilou.
- Tem certeza? Já conversei com bruxos suficientes, não me importo de ir embora, de maneira nenhuma. – ele frisou e ri.
- Tenho. Agüente mais um pouco, ok? Esses bruxos têm muita influência. Só me desculpe de não ficar mais. Vou procurar a Alex...
- Você já fez demais vindo comigo. Eu acabei te deixando sozinha.
- Não se preocupe com isso. Boa sorte com o Slug. – completei sorrindo e ele retribuiu – Te vejo amanhã.
- Ok.

Segui sozinha pelo corredor e Yoshi entrou novamente na festa. Estava chegando à Lufa-lufa quando Logan passou murcho por mim, sem dizer uma palavra. Alex estava sentada em uma das poltronas do salão comunal, cuspindo fogo. Sentei-me de frente pra ela e esperei que se acalmasse para falar.

- Logan queria vir até essa festa do Slug, pois ele havia convidado vários preparadores famosos, você sabe. Foi me buscar na casa do meu avô e depois eu iria para o Texas com ele, passar a Páscoa. Mas foi só encontrarmos o Kyle... – ela não completou a frase, mas não precisou. – E meu avô ainda quer que eu e Kyle voltemos a ser amigos novamente. Como? Ele é um grosso! E Logan um teimoso. Se eu estou namorando ele, é porque quero ficar com ele, não é? Esses ciúmes idiotas! – ela explodiu dando um soco na poltrona. Continuei em silêncio e alguns minutos depois, ela começou a rir. – Que cena mais patética. Me lembrei da briga da Sarah com o Sirius e o Melchior Estranho, lembra?
- Não foi sua culpa. Sinta-se importante, afinal, dois homens lindos e muito bem resolvidos estão brigando por você. No caso da Sarah, era briga de um homem lindo muito mal resolvido contra um extraterrestre. – Caímos na gargalhada. Como nenhuma das duas estava com sono, ficamos conversando até altas horas da madrugada.

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O domingo de Páscoa foi tranqüilo em Hogwarts. Tranqüilo até demais. Como o trem com o restante dos alunos só chegaria de noite, eu, Alex e Yoshi passamos o dia todo comendo chocolates, e sentados no jardim, conversando sobre NIEM’s, formatura e quadribol.

Quando Mark, Scott, Louise, Ben, Sam, Lu e Mirian chegaram, começaram a nos contar as novidades da Páscoa (muitas, ruins) e o restante do tempo de folga pareceu voar sem que me desse conta.

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Acordei assustada, várias horas depois. Pela cor do céu, a segunda-feira já estava prestes a amanhecer em Hogwarts. Sentia um aperto estranho no peito e me levantei para tomar água. Não tive tempo. A professora Sprout entrou no quarto, de roupão, parecendo muito abatida.

- Professora Sprout? O que está fazendo aqui? Está tudo bem? – perguntei assustada, mas ela não respondeu e me encarava com uma expressão de pena. Parecia perturbada.
- Professor Dumbledore pediu para que a levasse até o seu escritório, minha querida. – ela disse gentil, forçando um sorriso pouco convincente. – Troque de roupa.
- O que aconteceu? Algo sério?
- Ele dirá. Vou esperá-la lá embaixo. – saiu sem dizer mais nada e me apressei a trocar de roupa, em silêncio. Alex, Louise, Abby e Susan ainda dormiam tranquilamente.

Durante todo o caminho até o escritório de Dumbledore, professora Sprout ia me guiando em silêncio e ainda aparentemente muito nervosa, o que estava me deixando desconfortável. Nunca a vira daquela maneira. Mas quando passamos pela gárgula de pedra e pela bonita porta de carvalho, senti meu coração dar um salto e se afundar, em cima do estômago. Dumbledore estava sentado em sua poltrona, os oclinhos de meia-lua na ponta do nariz torto, as mãos juntas e os olhos azuis penetrantes e serenos, em mim. Em um canto da sala, em pé, estava Yoshi, de cabeça baixa. Sentados de frente à mesa do diretor, me encarando arrasados, Yuri e tia Yhara. Yuri se levantou e sem dizer qualquer coisa, me puxou para um abraço forte, começando a chorar. Fiquei parada, sem reação. Quando ele me soltou e olhou fundo nos olhos, eu já sabia.

- Nossos pais... – disse baixo no ouvido dele, que concordou com a cabeça recomeçando a chorar com mais força. Tia Yhara se levantou indo ao nosso encontro e também nos abraçando.
- Eu sinto muito. Nós vamos superar isso. Estou aqui com vocês. – ela dizia entre soluços, mas eu me sentia sendo carregada para bem longe dali e não derramava nenhuma lágrima.

why do you weep?
what are these tears upon your face?
soon you’ll see, all of your fears will pass away
safe in my arms, you’re only sleeping.

hope fades into the world of night
through shadows falling out of memory and time
Don’t say “we have come now to the end”
white shores are calling
you and I will meet again.

Into the West – Annie Lennox