Thursday, November 13, 2008


31 de Outubro de 1999

- Nicholas, fique parado, preciso arrumar a fantasia – Anna puxou Nicholas para perto dela e o capuz caiu para trás – Pronto, cinto preso. Tome, segure isso – E lhe entregou um sabre – Perfeito! Não está a cara do Luke Skywalker?
- Pelo tamanho, está mais pra Chewbacca – Kegan falou rindo e Ben atirou a varinha nele, que a pegou no ar – Estou brincando, está ótima a fantasia, Nick. E a sua também, mano. Pegou essas vestes do próprio Dumbledore?
- Sim, encontrei algumas na antiga sede da Ordem. E você? Está vestido de que?
- De gladiador, ora!
- Ah sim, pensei que só queria usar saia... – e ele lhe devolveu a varinha, atirando com força
- Você sabe que os trouxas vão pensar que você é Merlin, não é?
- É, mas foi a solução mais pratica, assim nenhum bruxo me reconhece. Estão todos prontos? Podemos ir?
- Calma, ainda falta meu pequeno! – Anna levantou do chão apressada e sumiu pela porta – Esperem na sala, já termino de arrumar o Jake!

Pegaram as sacolas em forma de abóbora da mesa e sentaram no sofá para esperar. Era o primeiro Halloween do Nicholas depois de já estar totalmente entrosado com toda a família e ele estava ansioso. Esse ano seu pai decidiu passar a data em Londres e iam levar Jacob e os sobrinhos de Louise, Otter, Nigel e Rebecca, então Kegan se ofereceu para ajudar a controlar a tropa. Anna voltou do quarto minutos depois com Jacob vestido de Harry Potter. Os óculos redondos eram quase do tamanho de seu rosto, de tão pequeno que ele era.

- Não adianta falar “Anna, os trouxas não conhecem Harry Potter!” – a irmã já veio avisando – Ele quer porque quer ir vestido assim, era uma batalha perdida. Então se perguntarem, digam que é de um livro sobre um menino bruxo que só foi lançado no Alaska!

Jacob corria pela sala fingindo lançar feitiços com a varinha de brinquedos e riram quando Nicholas, para se defender, “acionou” seu sabre de luz e os dois começaram um duelo fictício em cima do sofá. Entregaram as abóboras/sacolas a eles e saíram. No caminho até o bairro onde os sobrinhos de Louise moravam eles já foram enchendo as sacolas e quando chegaram a St. James, os três já os esperavam do lado de fora, fazendo a maior bagunça. Otter estava vestido de Freddy Krueger, Nigel de Jason dos filmes Sexta-Feira 13 e Rebecca de Princesa Jasmine. Os três se juntaram a Nicholas e Jake e a partir daí, a noite foi um caos.

Caminhar pelas ruas de St. James e dos bairros vizinhos com 5 crianças desesperadas atrás de doces era, de longe, a tarefa mais difícil que já delegaram aos dois irmãos. Dementadores e comensais da morte nunca deram tanto trabalho assim. Eles estavam levando a sério toda a historia de que, se não der doce, tem que levar trote. Anna fiscalizou para que Nicholas e Jacob não saíssem com armas em potencial de casa, mas Otter e Nigel carregavam munição de sobra. E os adultos responsáveis perceberam isso tarde demais.

Estavam parados na calçada enquanto eles iam bater em mais uma porta e um homem rabugento atendeu. Não levou nem cinco segundos para despachar as crianças. Já preparavam para incentivar a bater na próxima casa quando viram Nigel puxar uma sacola de dentro da mochila e num piscar de olhos, os cinco tinham um ovo em cada mão e arremessavam contra a fachada da casa do homem. Correram apavorados e Ben agarrou Jake e Rebecca em uma braçada só e Kegan agarrou Otter, jogando o menino por cima do ombro. Os outros dois já estavam do outro lado da rua quando as luzes da casa do homem acenderam e ele abriu a porta, praguejando em alto e bom som.

- O que estão fazendo? – Kegan brigou, mas eles riam de gargalhar, e era difícil não rir também
- Ele não tinha doce e a tradição diz: gostosuras ou travessuras – Nigel se justificou e foi apoiado pelos outros quatro
- Mas ovo? – Ben exclamou incrédulo – Vai levar um bom tempo pra ele lavar aquilo!
- Ovo podre, tio – Otter riu – Passamos o ano todo guardando os ovos que o vovô ia jogar fora.
- Pai, você viu onde eu joguei o ovo? – Nicholas dizia empolgado – Acertei no 2º andar!
- Tio, tio, eu joguei ovo no moço! – Jacob ria orgulhoso - Foi legal!
- É, só não vamos contar pra mamãe, ok? – Kegan deu três tapinhas leves nas costas dele – Vamos andando antes que ele chame a policia!

Eles se deram por vencido de que por mais que reclamassem aquilo ia se repetir em todas as casas que se recusassem a dar doce e seguiram adiante. Kegan confiscou o saco de ovo podre depois que uma segunda casa foi alvejada, mas eles tinham mais munição. As sacolas já estavam pesadas de tantos doces e pararam para descansar na praça da cidade. As crianças faziam um balanço do que haviam coletado quando ouviram um grito seguido de som de coisa quebrando e depois um urro. Levantaram já tateando as varinhas no bolso, mas uma massa de meninos fantasiados correu pra fora do gramado e viram que era alguma travessura. As crianças cataram as sacolas e correram na direção dos gritos e eles foram atrás. Alguns meninos ainda batiam em retirada e viram um homem fantasiado de monstro, com uma serra na mão e coberto de ovo dos pés a cabeça. Um último menino correu do jardim e esbarrou em Rebecca, derrubando-a. Kegan puxou o garoto do chão e Ben levantou a garota. Ela tinha ralado o cotovelo e já ameaçava chorar.

- Desculpa, não vi você.
- Tudo bem, não machucou muito, não é, Becky? – Ben falou esfregando o cotovelo dela
- Que fantasia é essa, menino? – Kegan perguntou curioso
- Gene Simmons, do Kiss – respondeu como se fosse obvio, mas até que era. Ele estava mesmo com um figurino idêntico ao que a banda usava nos shows.
- Como é seu nome? Cadê seus pais?
- Connor! – uma mulher fantasiada de camponesa veio correndo pela rua – Que gritos foram aqueles?
- O Adam bateu na porta e saiu um monstro com uma serra elétrica na mão, todo mundo se assustou e atiraram os ovos nele. Ai corremos, ele não ia mais querer dar doce.
- E cadê as crianças? – ela parecia desesperada
- Não sei, cada um foi pra um lado – ele deu de ombros e virou pra Rebecca – Não machucou mesmo? – ela negou com a cabeça, tímida
- Precisa de ajuda pra alguma coisa? – Kegan falou preocupado com o pânico dela
- Sai com as crianças do bairro pra pedir doce e agora todas sumiram! E olha que nos mudamos tem só dois meses, os pais vão me adorar agora...
- Calma, a gente ajuda a procurar. Sou Kegan, esse é meu irmão Ben.
- Andrea, prazer. E obrigada!
- Sem problemas, vamos nos espalhar que fica mais fácil. Crianças, acham que conseguem ficar quietas e em um lugar só por alguns minutos? – Ben perguntou e eles assentiram com a cabeça
- Não vamos demorar, não saiam daqui dessa praça, entenderam? - Kegan reforçou
- Connor, fique com eles, por favor. Meu marido está vestido de espantalho, então se virem um, gritem e contem o que aconteceu, por favor.

Deixaram as crianças na praça e saíram para ajudar a localizar as outras oito. Demoraram cerca de meia hora pra encontrar todas elas, de acordo com as descrições de rosto e fantasia que usavam dadas por Andrea. Voltaram com elas pra praça e qual não foi a surpresa ao perceberem que agora eram as suas crianças que estavam sumidas? Ben olhou em volta já com a mão na cabeça, mas o pânico não durou muito. Ouviram risadas do outro lado da praça e barulho de pés correndo pela rua. Os seis apareceram rindo e com pedaços de papel higiênico nas mãos. Olharam pro ponto de onde eles partiram e até mesmo um cego seria capaz de ver todo o quintal daquela casa decorado com papel higiênico. As fitas corriam de uma ponta a outra do jardim, penduradas em arvores, entupindo a fonte que decorava a entrada e estiradas por toda a extensão do gramado, tornando impossível ver a cor da grama.

- Ele não quis dar doce? – Kegan perguntou rindo
- Não, disse que éramos uns bastardos – Connor deu de ombros
- O que é um bastardo, pai? – Nicholas perguntou
- Nada, é só uma palavra feia, nunca chame ninguém assim, entendeu? – e ele fez que sim com a cabeça
- Acho que todo mundo aqui já coletou doce suficiente pra passar a noite acordada, não é? – Andrea se largou no banco, cansada
- Também acho que estamos bem de doce por hoje... – o marido espantalho falou

O protesto foi geral. A criançada começou a reclamar alto dizendo que não tinham andado o bairro todo e eles eram 4 contra 14, então acabaram cedendo. Agora se juntaram e passaram o resto da noite com aquele grupo enorme de crianças já cheias de açúcar no sangue e em um nível altíssimo de hiperatividade, mas deram conta. Jacob, Nicholas, Otter e Nigel haviam se dado muito bem com o menino chamado Connor e Rebecca, por ser agora a única menina do enorme grupo, estava mais tímida, mas andava ao lado dos primos participando da conversa. Foi o primeiro Halloween dos seis juntos. Eles nem imaginavam, mas era o primeiro de muitos que ainda estavam por vir.

ººº

31 de Outubro de 2010

- Prontos? – Nigel perguntou checando a passagem
- Espera! – Jacob berrou e assustou os amigos – Pronto. Achei meus óculos.
- Ainda acho tão arriscado fazer isso todo ano... – Rebecca arriscou, mas Connor a abraçou por trás, a sacudindo. Ele não percebeu, mas isso causou arrepios na garota que iam dos pés até os fios de cabelo
- Relaxa, Becky. Você mesma disse que todo grupo precisa de uma tradição, e essa é a nossa. – o garoto a soltou e apertou seu queixo. Ele também não notou suas bochechas levemente coradas.
- Exato. Foi numa noite de Halloween que eu, você e Nigel conhecemos Nick, Jake e Connor, e desde então sempre passamos a data juntos, pedindo doces – Otter falou ajeitando as luvas com garras do Freddy Krueger
- Vamos logo, pessoal – Nicholas apressou os amigos – Daqui a pouco Filch passa pelos corredores fazendo ronda e não conseguimos sair. Hogsmeade está cada vez maior e nosso tempo cada vez mais curto!

Rebecca arrumou o cabelo pela ultima vez no espelho, Connor conferiu se a pintura do rosto ainda estava intacta e Jacob arrumou os óculos redondos no rosto. Nigel foi o primeiro a passar correndo pelo saguão em direção ao pátio, fazendo sinal para os outros o seguirem. Halloween sem Trick or Treat para eles, não era Halloween. Fizeram disso uma verdadeira tradição, e ainda pretendiam fazer muitos anos à frente.