Monday, August 16, 2010


Agosto de 2014

Dormia o mais confortável que em minha cama do acampamento permitia, quando uma claridade absurda invadiu o quarto. O sol estava tão forte que mesmo de olhos fechados senti incomodo e quando os abri, muitos pares de mãos me agarraram e fui arrancada da cama sem cerimônia alguma.

- Feliz aniversário! – os agressores gritavam a plenos pulmões e só então os rostos começaram a entrar em foco. Eram meus amigos do acampamento.
- Merlin, não podiam ter feito um bolo e esperado eu chegar para o café? – reclamei, mas não soava nem um pouco chateada.
- Vamos embora hoje, não temos tempo para café da manhã – Daniel colocou um chapéu cônico verde na minha cabeça e Matt assoprou uma corneta na minha cara.
- Ok, ok, vamos começar a festa!

Taylor começou a disparar feitiços e encheu o quarto de balões coloridos, enquanto Katie fazia o bolo flutuar até a única mesa limpa do chalé. Lisa então ligou o som e deu inicio a bagunça. Aquele era o último verão de muitos no acampamento e foi uma ótima maneira de me despedir dos amigos que fiz ali e que dificilmente veria outra vez.

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Depois da bagunça que meus amigos fizeram para comemorar meu aniversário de 15 anos, cada um voltou para o seu chalé para arrumar as malas, pois era hora de partir. Aquele havia sido um verão agitado. Muitos campistas novos lotaram os chalés e os monitores precisaram inventar todo o tipo de atividade diferente, além das aulas, para manter todos ocupados. A aula de arquearia havia rendido bastante e eu já não acertava pássaros no ar, e sim o alvo. Thruston estava de volta e ainda mais sociável que o ultimo verão, veio me cumprimentar animado logo no 1º dia e nosso grupo de Hogwarts passou o mês inteiro junto. Até beisebol eu joguei, embora não tenha terminado bem para todo mundo, mas não tenho culpa de terem me colocado como rebatedora. E para completar tudo de bom que aconteceu, vencemos a captura da bandeira pelo segundo ano consecutivo, dessa vez sem precisar usar Daniel como kamikaze. Aquele verão ia deixar saudades.

Minha mãe já estava me esperando do lado de fora do portão principal e arrastava minha mala pela estradinha de pedras quando alguém me chamou. Logo percebi que era Thruston, encostado numa cerca de madeira com os pés apoiados na mala. Desviei o caminho até lá.

- Não vi você hoje cedo, na bagunça do chalé – falei parando ao seu lado e encostando a mala na cerca.
- Não achei que fosse gostar de ser arrancada da cama as 7h e ver a minha cara usando um chapéu cônico – ele riu – Mas em todo caso, feliz aniversário.
- Obrigada.

Ficamos em silencio no que parecia uma eternidade. Ok, nos dávamos bem no acampamento, mas não éramos amigos nem nada, não tínhamos assunto agora que aquela parte do verão tinha terminado. Voltaríamos a Hogwarts e ao normal, mas agora aquilo não parecia mais o certo. O normal, agora, era o que acontecia durante o verão. Graças a Merlin ele pensava o mesmo e me poupou o trabalho de ter que falar primeiro.

- Não faz o menor sentido nos ignorarmos durante o ano inteiro e nos darmos tão bem aqui.
- Concordo.
- Não precisamos ser amigos, mas não vou mais fingir que não estou lhe vendo quando entrar na sala de aula. Vou falar com você e espero que faça o mesmo.
- Estamos mesmo muito velhos para brigas sem um motivo de verdade. Vou responder se vier falar comigo, e não atacá-lo com um feitiço.
- Ótimo – ele tirou os pés da mala e ficou de pé direito, de frente para mim, e estendeu a mão – Trégua?
- Ainda não gosto de você e vamos competir na sala e no campo, mas sim, trégua.

Apertei sua mão em sinal de paz e até agora não sei explicar direito o que aconteceu, mas não as soltamos de imediato. Ao invés disso, nos aproximávamos cada vez mais. Já podia até ouvir a respiração pesada dele quando a voz de Daniel me trouxe de volta a razão e me afastei, soltando sua mão.

- Ih, foi mal – Daniel abafou uma risada e Thruston passou a mão no cabelo, visivelmente constrangido. Eu não queria nem me olhar no espelho, devia estar da cor do cabelo dos Weasley – Só vim me despedir, até mês que vem na estação.
- Até Setembro, Dan – peguei a mala do chão com um sorriso sem graça no rosto – James. – o cumprimentei com um aceno de cabeça rápido e me afastei mais depressa do que pretendia. Só fui me dar conta de que havia chamado-o pelo primeiro nome horas depois.

Mamãe já me esperava do lado de fora do portão e abriu os braços para me receber, já me desejando feliz aniversário antes mesmo de dizer olá. Ela fez minha mala levitar e começamos a caminhar abraçadas para longe da aglomeração de pais, onde poderíamos usar a chave de portal. Estava tão perturbada que não havia me ocorrido à idéia de que ela pudesse ter visto o que estava acontecendo perto da cerca. E ela viu.

- Então... Aquele garoto não era o que você odiava? – o tom de deboche em sua voz era tão nítido que senti meu rosto esquentar.
- Continuo não gostando dele.
- Não foi o que me pareceu. Lembra-se da nossa aposta?
- Não esqueci a aposta e ninguém venceu ainda. Foi um momento de fraqueza, não vai mais acontecer.
- Ah, momentos de fraqueza... – mamãe deu dois tapinhas no meu ombro – É sempre assim que começa.

Deduzi que qualquer coisa que eu dissesse seria usado contra mim e que o melhor era me calar, então me limitei a suspirar cansada e balançar a cabeça, enquanto ela dava risada caminhando ao meu lado pela colina. Seria um longo mês em casa...

ºººººº

Depois que fui embora do acampamento, passei somente uma semana no Brasil e segui com minha família inteira para Londres. Sempre passava o final das férias lá, já que tínhamos parentes para visitar e compras a se fazer no Beco Diagonal, e eu aproveitava para matar as saudades de ao menos uma parte dos meus amigos, já que JJ e Jamal moravam na cidade. Eles passavam quase todo o tempo na casa do tio George comigo e já contávamos os dias para o dia 20, quando iríamos para o Texas. Tia Alex havia decidido fazer uma festa de 15 anos para Haley e não víamos a hora de reencontrar o resto da turma.

O dia estava chuvoso e impossibilitados de ir a qualquer lugar, pedimos pizza e nos acomodamos no sofá para um torneio de videogame, com Rupert, Nick, Nigel, Otter e Connor, que apareceram para uma visita. A casa estava lotada e meus pais e meus tios conversaram na cozinha alheios a bagunça que fazíamos na sala, quando duas corujas ensopadas entraram pela janela respingando água em todo mundo. Tio Ben recolheu os envelopes que elas traziam e elas saíram outra vez, mas não sem antes se sacudirem e molharem o teto da cozinha.

- Cartas de Hogwarts – ele viu o emblema no envelope e nos mostrou – Clara e Rupert.
- Deixa a minha ai que já vou abrir – respondi concentrada no jogo, mas Rupert correu para abrir a dele.
- As nossas devem ter chegado também, Jamal – JJ comentou – Já não era sem tempo, mamãe estava querendo adiantar as compras de livros antes de me despachar pra casa da tia Alex.
- Ei, olha isso! – Nigel puxou o envelope da mão de um Rupert atônito – Rup ganhou o distintivo de monitor!
- Eu nem me lembrava que esse ano eles iam escolher os monitores – Rupert olhava para o distintivo cheio de orgulho.
- Parabéns, cenoura! Só não pega muito no nosso pé, ok? – Jamal falou e Rupert riu.
- Como se fosse adiantar alguma coisa – completei rindo e passei o controle pro Nick, indo buscar meu envelope – Nossa, ele está gordo. Será que veio alguma advertência atrasada?

Quando abri o envelope para ver porque estava tão pesado, levei um susto. Junto da lista de materiais veio outro envelope menor que quando o virei de cabeça para baixo, derrubou um distintivo verde e prata na minha mão. Tinha um grande M no meio, sobreposto sobre a serpente da Sonserina. Um M de monitor.

- Ah, não brinca! – Nigel tomou o distintivo da minha mão, tão incrédulo quando eu – O Rup era esperado, mas você?
- Deve ter sido um engano, esse envelope deve ser da Leslie – falei meio atordoada – Ela mora aqui em Londres, não é?
- Não é pra Leslie não, Clara – Jamal levantou do sofá e pegou o distintivo na mão – O envelope tinha seu nome.
- Tio Yoshi deve ter perdido o juízo – JJ também veio ver de perto – Mas prefiro você de monitora, a Leslie seria um pé no saco.
- É, agora vamos torcer pra ele não ter nomeado Sheldon também – Jamal acrescentou e cheguei a sentir um arrepio na espinha. Gostava do Sheldon, mas ele com poder na mão faria alguns estragos.
- Yoshi deu o distintivo a você como um voto de confiança – tio Ben falou se aproximando para ver o meu e o de Rupert – Ele sabe que você é perfeitamente capaz de honrar o cargo.
- Ótimo, tudo que eu precisava, expectativas de um professor – revirei os olhos e todo mundo riu.
- Quem você nomeou pra monitores, tio Ben? – JJ perguntou curioso.
- Zachary e Kaley Walker. Ambos são bem comunicativos e populares na Lufa-Lufa, sem deixar as notas caírem – ele respondeu parecendo orgulhoso dos gêmeos – E reza a tradição que os monitores da Lufa-Lufa precisam ser animados – e trocou uma risada cúmplice com minha mãe, mas que ninguém além dos dois e dos demais adultos pareceram entender.
- E você, tio George? – perguntei ignorando as risadas que não entendia.
- Artemis e James Thruston – eu queria não ter reagido, e na verdade nem percebi que reagi, mas o olhar que minha mãe me lançou denunciou que tinha feito algum movimento delator – Apesar dos recordes de detenção de ambos, Artemis é muito dinâmica e não tem vergonha de nada e James, mesmo com todos os problemas, é um dos melhores alunos do 5º ano e popular o suficiente para conseguir controlar alunos quando necessário.
- O que foi? – papai percebeu mamãe me olhando.
- O que foi o que, Remo? – para minha sorte, mamãe era uma excelente atriz quando necessário.
- Você olhou pra Clara de um jeito esquisito e Madeline e Scott riram – agora todos estavam prestando atenção. A sensação que tinha era de que meus ossos estavam derretendo e eu ia cair no chão como uma panqueca a qualquer momento.
- Você está tendo alucinações, ainda estava rindo do que Ben falou.
- Quem será o outro monitor da Corvinal e da Sonserina, hein? – interrompi depressa.

O assunto voltou para os monitores daquele ano, mas papai ficou me olhando desconfiado pelo resto da tarde. Não demorou muito e Hiro nos chamou pelo espelho de duas vias, comunicando que ele era o outro monitor da Sonserina, o que me deixou imensamente aliviada por não ter que lidar com Sheldon e um poder nas mãos e o assunto passou a ser quem iria trabalhar em dupla com Rupert. Vez ou outra, sem que papai notasse, mamãe gesticulava alguma piada sobre a nossa aposta e o fato de ter dois monitores na lista que poderiam ajudá-la a vencer. Eu tentava ignorar, mas não era fácil. Jamais admitiria para ela, mas ia começar a me preparar psicologicamente para perder. E eu ia perder feio.