Saturday, December 03, 2011


- O que foi? Está me desconcentrando – disse irritada, vendo James passar a mão no cabelo de cinco em cinco segundos.
- Tem alguma coisa errada – ele puxou minha mão e colocou na cabeça dele. Tinha mesmo um galo – Sentiu?
- É, tem um galo ai, deve ter sido de quando a Arte estuporou você – e embora tenha tentado, não consegui segurar a risada.
- Hoje de manhã eu esqueci de tomar café. Será que a pancada afetou minha memória? – a voz dele era realmente preocupada e só me fez rir ainda mais.
- Por Merlin, não comece com isso, seu hipocondríaco. Já basta uma desmemoriada aqui, você esqueceu o café porque está cansado, estamos fazendo muita coisa ao mesmo tempo.

James não parecia muito convencido, mas não teve tempo de argumentar. Um livro enorme e pesado caiu na nossa frente, nos assustando, e Gabriela se largou na cadeira do outro lado da mesa. A bibliotecária pigarreou por causa do barulho e ela pediu desculpas, se jogando por cima do livro desanimada.

- O que aconteceu, Lino? Alguém roubou seu cobertor? – perguntei vendo a cara depressiva dela, o que acabou fazendo com que ela risse.
- Garotos são tão idiotas – ela resmungou e afundou a cabeça no livro.
- Não somos tão ruins... – James falou do meu lado, dando de ombros.
- Devon, certo? – ela assentiu, sem tirar a cabeça do livro – O que ele fez agora?
- O que ele não fez é a pergunta certa.
- O Baile – ela assentiu outra vez – É, eu fiquei sabendo.
- O que tem o Baile? Ele convidou outra pessoa? – James perguntou curioso e nós duas olhamos pra ele – O que foi? Eu estou bem aqui, não faço parte da conversa?
- Acho que devia passar na enfermaria mesmo pra dar uma olhada na cabeça – apontei para onde estava o galo e ele rapidamente levou a mão ao lugar – Só por precaução.
- Já entendi, não sou bem vindo – ele recolheu os livros e levantou, me beijando antes de sair – Nos vemos mais tarde.
- Então, Devon. É, ele é um idiota – falei quando James saiu da mesa.
- Não é como se eu estivesse esperando que ele fosse me convidar, sabia que isso não ia acontecer, acho que estou mais irritada por não ter tido coragem de fazer isso eu mesma.
- Quer saber? Sábado não deveria ser dia de estudar, tenho uma idéia melhor: que tal largarmos esses livros todos, reunir as meninas e passarmos a noite comendo bobagens, bebendo e falando mal dos garotos?
- Você não ia encontrar o James mais tarde?
- Ah, eu recompenso ele amanha. Então, o que acha? Noite das garotas?

Gabriela abriu um sorriso animado e aquilo foi o suficiente para mim. Fechei todos os livros de Transfiguração que estavam espalhados na mesa, joguei tudo na mochila e saímos da biblioteca para procurar as meninas. Aquele sábado à noite ia render.

ºººººººº

Às 20h daquele sábado estava parada na entrada da masmorra com Haley e Keiko esperando as meninas, que iam chegando aos poucos. Gabriela havia chamado Sophie, Arte trouxe Lenneth, que chamou Penny, que por sua vez convidou Leslie. E Lena chegou com Kaley, que trouxe Amber. Não era o nosso grupo habitual, mas ia ser interessante ouvir histórias diferentes para variar um pouco. Quando todas haviam chegado entramos na sala secreta, mas ao invés de montarmos acampamento ali, levamos o grupo para os túneis que davam no nosso QG.

- Para onde estamos indo? – Amber perguntou receosa.
- Para o nosso refúgio – Haley falou – E ninguém pode saber da existência dele, ok?
- Ninguém mesmo – Keiko completou e todas assentiram – Os meninos sabem, é claro, mas mais ninguém.
- E por incrível que pareça eles sabem guardar segredo, então não nos decepcione – Lena finalizou.

Caminhamos nos túneis por quase meia hora até chegarmos ao abrigo. Já havia passado nele mais cedo com Haley e limpamos tudo, sumindo com os caldeirões com as poções de animagia e todos os livros que andávamos lendo, deixamos apenas a decoração habitual. Todas ficaram surpresas por descobrir um abrigo daqueles nos terrenos de Hogwarts, mas ninguém perguntou como o encontramos ou o que ele era. Já foram se acomodando pelas poltronas e tapete, abrindo as mochilas cheias de chocolates e sorvete e começando a distribuir. Puxei uma caixa que estava escondida debaixo da mesa cheia de whisky de fogo e coloquei junto das garrafas de cerveja amanteigada que Penny trouxe. Não precisávamos de mais nada.

- Pronto, estamos todas aqui, pode começar a falar mal dele, Gabi – falei tomando um gole da cerveja amanteigada e Gabriela ergueu a dela.
- Oba, de quem vamos falar mal? – Kaley perguntou animada.
- Do Devon, que não convidou ela pro baile – Keiko respondeu e Kaley fez uma careta divertida.
- Opa, culpada – disse levantando a mão – Ele me convidou. Quer que eu dê um fora nele? Ele é bonito, mas também não é nenhum príncipe – Gabriela pareceu surpresa com a revelação, mas o jeito divertido que Kaley tinha de falar não criou tensão, e sim risadas.
- Não, por favor, pode ficar com ele! – Gabi respondeu – Já fui convidada por outro – ficamos olhando pra ela esperando o resto e ela riu – Jamal.
- Nosso príncipe de ébano não perde tempo, hein? – Haley comentou abrindo a primeira garrafa de whisky de fogo.
- Será que eles ainda têm aquele caderninho? – Lena perguntou e Arte parecia confusa.
- Que caderninho? Odeio não lembrar essas coisas!
- Um caderninho de conquistas, nós também mantínhamos um até o ano passado e você era a líder, não se lembra? – Keiko caçoou e por alguns segundos ela acreditou, mas ninguém conseguiu ficar sério muito tempo e ela sacou que era piada.
- A parte do caderno de conquistas é verdade, mas você estava namorando o Tuor, não anotava nada nele – expliquei e ela pareceu mais aliviada – Penny era a líder, na verdade.
- Ainda sou, ou ninguém deu uma espiada no Deus grego que me convidou pro Baile de Inverno? – ela falou rindo e Lenneth fez sinal de positivo.
- Karl é o garoto mais disputado de Durmstrang, algumas meninas da minha turma estão odiando você.
- Então manda elas pegarem senha – ela respondeu debochada e Kaley ergueu o copo.
- Isso ai, irmã! – e as duas bateram o copo, brindando.

Aquele foi o primeiro dos muitos brindes daquela noite. À medida que íamos jogando conversa fora, as garrafas de whisky de fogo e cerveja amanteigada iam esvaziando sem que percebêssemos. Até mesmo Amber estava bebendo, e muito. Observei-a por um tempo e percebi que mesmo que estivesse ingerido a mesma quantidade de álcool que qualquer uma de nós, parecia que não tinha bebido nada. Falava pouco, mas participava dos papos com seus pontos de vista peculiares. Até soltou algumas piadas, mas não dava nenhuma informação da vida pessoal. Quando vi a terceira garrafa de whisky rolar vazia pelo chão e ela ainda serena, entendi que não era com álcool que extrairíamos alguma informação.

- Porque os garotos têm mania de querer ouvir você falando de seus sentimentos? – Haley falou vaga, olhando pra dentro do copo vazio.
- Garotos fazem isso? Em que planeta? – Gabi perguntou.
– Por que diz isso? – Leslie perguntou.
- Zach disse que me ama e eu fiquei tão chocada que só disse obrigada e o beijei para ele calar a boca. Desculpa Kaley, mas é a verdade.
- Não precisa se desculpar, meu irmão é meio carente – ela revirou os olhos – E sendo sincera também, esse namoro de vocês não vai a lugar nenhum. Acho melhor terminarem logo antes que ele comece os planos pro casamento.
- Que casamento? – ela perguntou alarmada - Para de rir Clara, você disse que ele era normal!
- Kaley tem razão, saímos só uma vez e ele achou que estávamos namorando – falei ainda rindo – E vocês estão, então o próximo passo é o casamento.
- Acho tão bonito jovens apaixonados, mas acho que a pergunta certa aqui é: você gosta dele, Haley? – Arte quis saber.
- Ele é lindo, ótimo companheiro, por que eu não gostaria dele?
- Então por que você está com esse sorriso amarelo na cara? – Amber perguntou direta e a sala caiu em um silêncio mórbido, todas encarando Haley.
- Eu só estou chocada, só isso. Ninguém nunca disse “eu te amo” para mim antes e... Por que você está encarando a lareira, Lena? Perdeu alguma coisa lá?

A conversa parou e todo mundo olhou para onde Lena estava sentada, próxima à lareira. Ela já estava encarando a madeira queimada há algum tempo, completamente aérea. Não sabia se ela estava bêbada ou só tinha perdido o interesse no papo. Kaley pegou um pedaço de papel amassado e atirou nela, que saltou assustada e voltou a reparar nas pessoas na sala.

- O que foi? – perguntou ainda perdida.
- Haley estava dizendo que Zach disse “eu te amo” e ela disse obrigada – Arte a atualizou – E eu que sou a desmemoriada...
- Julian quase me disse isso, mas não o deixei terminar, estava tirando sua camisa... – no mesmo instante que disse parece que se arrependeu, porque arregalou os olhos quando todas as cabeças se viraram para ela.
- O QUE? – Keiko cuspiu a cerveja amanteigada que tinha na boca em cima de Amber – Desculpe, foi o choque.
- Quando foi isso? Por que não nos contou? – Haley perguntou depressa, provavelmente aliviada pelo foco ter saído dela.
- Ou melhor, onde foi isso? – perguntei já temendo a resposta.
- No tapete de peles da lareira. Aliás, ele está ficando fino... – e todo mundo ficou de pé num único salto. Era inacreditável como os reflexos ainda estavam ótimos.
- Por Merlin, não diga que vou me tornar tia avó? – Haley perguntou com cara de nojo, empurrando o tapete com os pés com a ajuda de Keiko.
- Posso ser doida por gostar do seu sobrinho, mas não sou estúpida, ok?
- Por que não contou isso ao Dr. Pace quando ele perguntou se estava se relacionando com alguém na escola? – Amber perguntou se acomodando em uma das poltronas – É seguro sentar aqui?
- Sim, é, não tivemos tempo de chegar até ai. O que tem neste whisky afinal de contas? Veritaserum? – Lena passou a mão na testa suada, nervosa – E respondendo a sua pergunta, senhora “eu não conto nada de minha vida pessoal”: Não ia contar a ele que transei com um aluno do curso de aurores. Tem noção do que ia acontecer comigo?
- Eu respondo esta: ele ia te mandar direto pra uma aula de planejamento familiar e você ia ganhar um boneco pra fingir ser seu bebê – Haley disse já chorando de rir.
- Ah mas um ovo é muito mais legal, poderíamos desenhar carinha nele - disse Keiko
- Chamar de Sparkles... – Haley sugeriu.
- Ou Senhor Cabeça de Ovo – Lenneth sugeriu, rindo feito uma idiota.
- Sophie, você não falou praticamente nada a noite toda, ninguém aqui namorou o Rupert pra poder dar um aval, então desembuche! – Penny apontou a varinha acesa pra cara dela, como em um interrogatório.

Sophie ficou vermelha, mas já tinha bebido o suficiente para não se acanhar e começou a contar detalhes até demais do recente namoro que começou com meu primo. Percebi que Kaley se dividia entre ouvir o que ela dizia e observar Amber, e logo notei que ela ouvia o que estava sendo dito com uma atenção diferente. Dessa vez não parecia estar se divertindo, mas sim desconfortável. Era difícil dizer com certeza, já havia bebido demais e ela era um enigma, mas se alguém me mandasse apostar, diria que estava com ciúmes.

O interrogatório de Sophie acabou nos contagiando e o papo virou um divã, com cada uma contando sobre sua vida amorosa, com namorados fixos ou não, sem esconder nada. Até Amber entrou na brincadeira e contou como era o namoro com Rick. Arte, é claro, contou do namoro com Stefan e as investidas de Damon porque era só o que ela se lembrava, mas queria participar do papo. Já passava de uma da manhã quando olhei no relógio e resolvemos voltar pro castelo, antes que os cães de guarda de Arte decidissem descobrir porque ela estava demorando tanto numa masmorra. Nos despedimos ainda dentro da sala secreta e começamos a sair em grupos pequenos, cada uma voltando pro seu salão comunal. Havia sido uma noite muito interessante, mas depois de uma caixa de whisky de fogo, o quanto lembraríamos na manhã seguinte?

Edit: Texto feito com a ajuda da And Black.