Thursday, February 09, 2012


Sexta-feira, véspera do dia dos namorados.

Era muito tarde e como tinha aula sábado cedo já me preparava para subir para o dormitório e dormir quando o salão comunal da Corvinal recebeu a inesperada visita do professor Wade, do curso de auror. Ele trazia uma prancheta na mão e vinha acompanhado de Lena e James, ambos com cara de sono e totalmente perdidos. Já olhei logo para Julian, que estava largado no sofá conversando com Rupert, mas ele também não sabia o que estava acontecendo.

- Beckett, McGregor, venham comigo – ele apontou para nós dois e levantamos do sofá ainda perdidos.
- Aonde vamos, professor? – não me contive e perguntei.
- A aula de amanhã começa agora – ele consultou a prancheta outra vez e voltou a olhar para as pessoas no salão – Carmichael e Ackerly, vocês vêm também.

Os outros dois levantaram bocejando e saímos todos do salão comunal atrás do professor Wade, ninguém com coragem de perguntar primeiro que espécie de aula poderíamos ter depois da meia noite. Descemos até o primeiro andar e depois de passar na Lufa-Lufa e Sonserina para pegar o resto dos alunos, ele dividiu a turma. James, Lena, Julian, Penny, Tommy, Kaley, Zach e eu ficamos com ele e o restante seguiu para o outro lado do corredor com a professora O’Shea, que esperava a turma no hall de entrada. James foi quem perguntou primeiro.

- Professor, que aula vamos ter hoje?
- Vigilância – ele respondeu animado, indicando as cadeiras para nos acomodarmos – Hoje vocês vão aprender a ficar de tocaia. Vou levá-los em uma vigília a dois suspeitos.
- Fora de Hogwarts? – Penny se animou – Dois suspeitos de verdade?
- Sim, vamos até Londres, assim que Ty resolver aparecer... – ele consultou o relógio impaciente e a porta da sala abriu. Um homem igual ao Julian entrou – Ah, até que enfim. Tudo certo?
- Sim, tudo certo. McQueen está lá aguardando para passar o posto.
- Ótimo. Turma, aos que não sabem, esse é Ty McGregor, um amigo e também auror e que vai nos ajudar hoje – o homem cumprimentou a turma e sorriu para Julian e Lena, confirmando a suspeita de que era pai dele – Vou dividi-los em dois grupos de quatro e vocês ficaram dentro de um carro, estacionado em frente a casa onde os suspeitos se encontram.

Ele acenou a varinha e o quadro negro se encheu de rabiscos que mais pareciam um esquema tático de algum jogo de quadribol. Passou quase meia hora contando a história do caso, que ele e Ty estavam trabalhando juntos, e os motivos de precisar da vigília. Eram dois homens, um trouxa e um bruxo, suspeitos de envolvimento em um seqüestro bruxo. Como o envolvimento ainda não tinha sido provado e um deles era trouxa, feitiços estavam fora de cogitação, então tudo que podiam fazer era não deixar que eles fugissem à moda trouxa.

- Vocês vão usar isso – o pai de Julian distribuiu coletes à prova de bala para o grupo – Em hipótese alguma deverão usar feitiços contra os suspeitos. Na verdade, não deverão fazer nada além de observar. Vocês não são aurores ou policiais, ainda são alunos.
- Exatamente. As varinhas deverão ser usadas apenas em caso de extrema necessidade, o que não vai ocorrer, então elas deverão ficar em seus bolsos, paradas. Kaley, Penélope, Elena e Amber ficarão no carro A – e apontou com a varinha o desenho do carro parado à direita do prédio – e Julian, James, Thomas e Zachary no carro B – e apontou para o desenho à esquerda, depois apontou para um ponto C no meio deles – Ty e eu estaremos no carro C.
- Como é um exercício sobre vigilância e tudo que vocês devem fazer é observar, fiquem atentos a qualquer movimento estranho e chamem o nosso carro pelo rádio caso vejam alguma coisa suspeita. E não devem sair dos carros, em hipótese alguma, então quem bebeu muito suco de abóbora no jantar sugiro que vá ao banheiro agora, sairemos em 15 minutos.

Ninguém pensou duas vezes antes de obedecer e aproveitamos para voltar aos salões comunais e pegar um casaco mais grosso, porque apesar de não estar mais nevando, ainda estava frio e íamos passar a madrugada na rua. Saímos em direção a Hogsmeade exatamente 15 minutos depois e com uma chave de portal fomos transportados para Londres. Estávamos em Fulham, reconheci de imediato. Os carros vazios estavam estacionados nas posições do mapa que ele nos mostrou e paramos próximo a eles. O vento balançou o casaco do professor Wade e notei que ele estava armado.

- A casa é aquela, com as luzes do 2º andar acesas – e apontou para a única casa com a luz acesa da rua – McQueen disse que chegaram no fim da tarde e não saíram mais, e ninguém entrou. Um feitiço anti-aparatação foi lançado em volta do lugar, então contanto que eles estejam em um raio de 200m, não podem desaparecer. Entrem nos carros e observem. É um trabalho chato, mas faz parte da vida de um auror, precisam começar a se acostumar.

Entramos nos carros que ele apontou e ele e o pai de Julian foram para o deles, que ficava entre os nossos e com uma visão clara de toda a rua. Kaley e Penny se espalharam no banco da frente e fiquei na parte de trás com Lena. No começo ninguém dizia nada, estávamos concentradas na tarefa de apenas observar e ninguém queria correr o risco de piscar e perder alguma coisa, mas logo a tarefa se mostrou cansativa. Nada acontecia na rua, a luz da casa continuava acesa e tudo que víamos eram duas sombras passando de um lado para o outro, sem fazer nada suspeito. Os meninos também estavam entediados e começaram a nos chamar no rádio pra falar bobagens, mas a brincadeira acabou quando a voz do professor Wade cortou a de Julian avisando que o rádio dos três carros estavam interligados e eles estavam ouvindo o papo.

- Estou entediada – Penny colocou os pés em cima do volante e quase esbarrou na buzina – Que horas são?
- Três da manhã – Lena respondeu consultando o relógio – Uau, já se passou três horas dessa chatice?
- Minha bunda está ficando quadrada – comentei desconfortável no banco. Não tinha mais posição.
- E não temos rosquinhas ou café, como nos filmes trouxas? Esse negócio de vigilância parece mais legal na TV – Kaley resmungou e acabamos rindo.
- Quando a gente se formar e tiver porte de arma, deve ficar mais emocionante – disse colocando os pés no banco da frente, já sem sapato.
- Vocês vão entrar pra academia trouxa também? – Penny perguntou surpresa – Nunca pensei nisso.
- Eu sempre quis ser policial, antes mesmo de ser auror – Kaley agora estava animada. Falar disso sempre a deixava empolgada – Meu avô por parte de mãe é auror, mas o por parte de pai é policial. Como não ainda se era bruxa ou não, me espelhada no vovô Jenkins. Não sabia que podia ser as duas coisas até Micah se formar nas duas academias.
- Eu sempre pensei em ser só auror, mas Kaley falava tanto sobre ser policial também que acabou me contagiando – disse sincera e ela sorriu pra mim – Agora quero tanto ser policial quanto auror.
- Vocês são loucas, sabia? – Lena ainda estava espantada – Vão ter que se desdobrar pra se formar nas duas academias ao mesmo tempo.
- Não vamos fazer as duas ao mesmo tempo. Os primeiros dois anos são na Academia de Auror e só entramos no programa trouxa no último ano. Vamos nos separar da turma e ficar só com aqueles que também estão no programa, nossas aulas serão diferentes.
- Eu vou ficar só com a carreira de auror mesmo. Minha família é toda bruxa, não faz muito sentido – Penny declarou e Lena assentiu, concordando.
- Eu ainda tenho o trabalho do meu pai como tratador de dragões pra ajudar. Não tenho tempo de ter mais uma carreira.

A conversa parou de repente, quando todas as luzes da casa de acenderam. Paramos para prestar mais atenção e uma coruja entrou voando por uma das janelas abertas. Kaley chamou Micah e Ty pelo rádio e eles avisaram que tinham visto. Orientaram-nos a continuar no carro e saíram para rondar a casa. Cinco minutos depois os dois voltaram e avisaram que estava tudo sob controle. O que exatamente não sabíamos, mas nosso trabalho era só observar, não questionar. O assunto sobre as escolhas profissionais voltou.

- E onde vocês pretendem fazer isso? – Lena perguntou – Na Inglaterra mesmo ou vão se matricular no programa do professor Wade, na Califórnia?
- Eu vou ficar na Inglaterra mesmo, no programa da Scotland Yard. Nunca pensei em ir pra Califórnia... – disse pensativa. Aquela idéia nunca tinha me ocorrido, mas não soava tão mal.
- Eu não sei mais... – era a primeira vez que Kaley soava desanimada falando sobre aquele assunto – Ia ficar em Londres com Zach, tínhamos tudo acertado, mas de repente ele resolveu que vai voltar pra Boston depois da formatura e bagunçou os nossos planos. Estava animado de ficar porque estava namorando a Haley, mas agora ele diz que nada o prende aqui e quer voltar pra casa.
- E daí que ele quer voltar? Deixe-o ir. – Penny falou e concordamos.
- Não é tão simples assim. Zach e eu temos um vínculo maluco de gêmeos, nunca passamos mais que uma semana separados. A única vez foi quando éramos crianças e foi a pior semana das nossas vidas. Não sei se vou conseguir ficar longe dele.
- Vocês não são mais crianças, Kay. Vão ter que se separar um dia, e talvez essa seja a hora de quebrar o vínculo – disse séria e ela assentiu, mas rindo desanimada.
- Eu sei disso, mas não sei se estou preparada pra isso.
- Não sofra por antecipação. Ainda temos quatro meses até a formatura, tem bastante tempo pra decidir. – Lena disse solidária e ela sorriu outra vez, concordando.

Penny sugeriu que mudássemos de assunto e, sem cerimônias, perguntou a Lena como estava indo o namoro com Julian. Kaley checou se o rádio estava desligado e Lena começou a contar detalhes que eu não precisava saber, mas estava sendo obrigada a ouvir. As risadas eram tão altas que em determinado momento a voz do professor saiu do rádio outra vez e nos avisou que o propósito de uma vigilância era não ser descoberto pelos suspeitos. Os tons de vozes passaram a ser moderados dali em diante e os relatos de Penny sobre o bonitão de Durmstrang com quem andava saindo precisaram ser ouvidos com mais contenção. Eu estava evitando participar da conversa porque sabia que uma hora ia respingar em mim, mas não adiantou. Quando elas ficaram sem ter mais o que contar, senti três pares de olhos me encarando.

- Sua vez, Amber. Conte tudo sobre Rick – Kaley me pressionou e as duas apoiaram.
- Não tenho nada pra contar. Ele é legal, só isso.
- Ah qual é, não é possível. Estão namorando há quanto tempo? Três meses? – Lena falou inconformada – Você tem algo pra contar, não é?
- Merlin do céu, você ainda é virgem! – Penny berrou, e tapou a boca depressa olhando pros lados.
- Isso não é da conta de vocês.
- Estamos entre amigas aqui, ninguém está julgando – Kaley falou, mas fuzilei-a com o olhar e ela deu de ombros – Ok, talvez só um pouco, mas foi o choque da noticia.
- Não, não estamos julgando – Lena tentou colocar panos quentes – É que pensávamos que você e Rick estavam indo bem. Vocês parecem um casal perfeito, sabe? Pensávamos que realmente gostasse dele.
- Eu gosto dele, não disse que não gostava. Só não...
- ...ama ele – Kaley completou pra mim e acabei concordando.
- Olha, eu não sou perita no assunto, mas me parece que o Rick está apaixonado por você... – Penny disse olhando para Kaley, que assentiu.
- Sim, está. Não agüento mais ele me perguntando o tempo todo do que você gosta ou o que ele pode fazer pra lhe agradar, porque você não diz nada.
- Se ele está apaixonado por você e você não sente o mesmo por ele, por que ainda estão juntos? – Lena perguntou e as três me encaravam – Acha que poderia sentir o mesmo um dia?
- Não, nunca pensei que um dia fosse sentir o mesmo que ele – admiti, por mais difícil que fosse – A verdade é que só comecei a namorar com ele para tentar alguma coisa nova.
- E como você nunca esteve apaixonada por ele, sabia que quando terminasse não ia sentir nada – Kaley completou mais uma vez e, mais uma vez, concordei.
- Isso não é justo com ele e você sabe disso – Penny falou séria.
- Não pode continuar deixando que ele pense que estão no mesmo barco – agora foi a vez de Lena falar sério.
- Eu sei disso tudo.
- Então vai fazer o que a respeito? – Kaley perguntou, mas minha resposta foi interrompida pelo barulho de vidro quebrando.

Olhamos para fora a tempo de ver uma lata de tinta spray voar pela janela e cair no meio da rua. A lata explodiu e uma fumaceira tomou conta de todo o quarteirão, tornando impossível enxergar qualquer coisa. Kaley fechou a janela depressa e vimos os vultos de Micah e Ty passarem correndo, sinalizando para não sairmos do carro e ficarmos atentos. Quando a fumaça começou a dissipar, os dois homens que estávamos vigiando estavam na rua, na mira da arma do professor Wade e da varinha do pai de Julian. Os quatro estavam imóveis, se encarando. Kaley tornou a abrir a janela para escutarmos melhor.

- Não se movam – Micah disse em tom de aviso. Ele tinha só um dos dois na mira, mas o alerta servia para ambos.
- Você não pode usar magia – um deles, o que devia ser o bruxo, disse indicando Ty com a cabeça.
- A menos que seja necessário, não – Ty disse despreocupado – Dê mais um passo, por favor. Eu imploro.
- EI, o que pensa que está fazendo? – Micah virou a mira da arma do trouxa pro bruxo, quando ele colocou a mão no bolso de trás do jeans.
- Você está pegando sua varinha? – Ty perguntou debochado, e se virou para Micah – Ele está pegando a varinha?
- Sim, ele está com a mão nela.
- Minha memória é muito boa, Sr. Scofield. Lembro-me muito bem de estar na audiência onde o juiz da Suprema Corte dos Bruxos proibiu que o senhor chegasse perto de uma varinha até o fim do caso. Se estiver com a mão nela, está infringindo a lei.
- Eu não fiz nada, ok? – o homem ficou nervoso e apontou a varinha para Ty, que mantinha a sua firme na direção dele – Não tenho nada a ver com isso tudo!
- Então largue essa varinha imediatamente. Não gosto de atirar, Sr. Scofield, mas farei isso se for necessário. Largue a varinha.

O homem, ainda nervoso, começou a tremer. Micah não abaixou a arma, enquanto Ty mantinha o trouxa na mira da varinha, embora não pudesse usá-la contra ele. Por um instante achei que ele fosse lançar qualquer feitiço em desespero, mas por fim ele atirou a varinha pra longe e colocou as mãos na cabeça. Ty caminhou até ele e o algemou e já estavam passando próximos ao nosso carro quando o outro homem correu até a varinha largada no chão e a apontou para Micah. Ele realmente era trouxa, pois não sabia nem como segurá-la corretamente.

- Está de brincadeira comigo, não é? – Micah riu, apontando o homem para Ty, que riu também.
- Não estou. Eu sei alguns feitiços, Joe me ensinou – ele tentava parecer firme, mas tremia mais que vara verde.
- Sr. Baker, eu vou contar até três para largar essa varinha. E o senhor sabe o que vai acontecer se eu chegar ao três e o senhor ainda estiver com ela apontada pra mim? – o homem tremeu mais um pouco e negou com a cabeça – Eu vou atirar na varinha, mas ela é muito fina e a probabilidade do tiro acertar a sua mão é de 98%. O senhor quer perder a mão? Não, não é mesmo? Então vamos lá: um... dois...

Antes que ele pudesse chegar ao três a varinha já tinha sido atirada pra longe, mas ao invés de se render como o outro, o homem saiu correndo na direção da casa do vizinho. Micah continuou parado no mesmo lugar, as duas mãos na cintura, incrédulo com a cena que estava presenciando. Ele deixou o homem correr desabalado e quando ele chegou à varanda da casa ao lado e se pendurou na calha para fugir pelo telhado, acertou um tiro certeiro nela. A calha caiu e o jogou no chão. Ele rolou escada abaixo e ficou estatelado na grama. Micah foi até lá e o algemou, o colocando de pé com um puxão só.

- Sabe, eu tenho que preencher um relatório toda vez que um tiro é disparado da minha arma, seu imbecil – disse irritado pro homem, enquanto o arrastada até o carro.
- A aula acabou, galera, podem sair – Ty disse quando Micah chegou com ele e o jogou dentro do carro em que eles estavam – McQueen está vindo com a viatura para levar esses dois idiotas, já que não posso aparatar com um trouxa.
- Opa, calma! – o homem que Micah segurava tentou se soltar e ele o atirou com tanta violência em cima do capô do nosso carro que saltamos assustadas – Onde você pensa que vai?
- Não podemos ir até a delegacia com vocês? – Zach perguntou e seus olhos até brilhavam. Os dois se olharam e riram.
- Ok, acho que merecem depois de uma noite toda de vigília – Micah respondeu e Ty concordou – Lá sempre tem rosquinhas e café.

Quando a viatura que o auror McQueen dirigia chegou e os dois foram arremessados dentro dela, nos dividimos entre os outros dois carros com Micah e Ty e o seguimos até a delegacia trouxa. Passamos o resto da madrugada acompanhando os dois serem fichados por tentativa de fuga e ataque a uma autoridade enquanto devorávamos uma caixa de rosquinhas e bebíamos todo o café disponível. O dia já estava claro quando finalmente voltamos para Hogwarts. Foi uma noite longa e cansativa, estávamos todos exaustos, mas havia valido cada segundo. Agora, mais do que nunca, eu sabia que iria seguir as duas carreiras.